Por Clóvis Gonçalves
Em
2022, foram registradas 67.626 ocorrências de estupros em mulheres no Brasil.
“Isso equivale a, aproximadamente, um estupro a cada 8 minutos no país”,
descreve a edição deste ano do Relatório Anual Socioeconômico da Mulher
(Raseam), lançado hoje (24), em Brasília, pelo Ministério das Mulheres. Conforme
o documento, o Sudeste, região mais populosa do país, teve o maior número de
ocorrências de estupro, somando 22.917 casos. Em seguida, ficou a Região Sul,
com 14.812 ocorrências. No Nordeste, foram registrados 14.165 estupros; no
Norte, 8.060 casos; e no Centro-Oeste, 7.672 episódios desse tipo de violência.
O
Raseam faz a compilação de estatísticas de pesquisas e registros
administrativos de diferentes fontes. Os dados sobre estupro das mulheres, por
exemplo, são do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O relatório também
utiliza de informações produzidas do Ministério da Saúde, dos Esportes, da
Justiça Eleitoral, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (Inep) e (Instituto Brasileiro de Geografia e EstatísticaI
(BGE). Os dados de diferentes fontes podem ter complementariedade. Sobre o
estupro, a Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar Contínua, do IBGE, sugere
que a alta ocorrência dessa forma de violência contra as mulheres está
refletida na percepção de risco. Uma em cada cinco mulheres entrevistadas em
2021 relatou sentir “risco médio ou alto de ser vítima de agressão sexual.”
O
relatório assinala que “a violência contra as mulheres é uma instituição
social, que funciona como um mecanismo mantenedor de relações sociais de
dominação e exploração.” Dados do Sistema de Informação de Agravos de
Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde, contabilizados nos atendimentos
ambulatoriais e hospitalares, somaram 344.242 registros de violência sexual,
doméstica e outras formas de violência. Sete de cada dez desses episódios
ocorreram contra as mulheres.
AGRESSÃO
As
estatísticas da Saúde ainda revelam que o principal local de agressão contra
mulheres adultas, de 20 a 59 anos de idade, naquele ano foi a própria
residência: 73% dos episódios, contra 14,5% de ocorrências em vias públicas e
3,2% em bares e restaurantes. Quanto à situação conjugal, 44,7% das mulheres
vítimas de violência na mesma faixa etária eram solteiras; 42,4% estavam
casadas; e 10,6% eram solteiras. Os homens foram “os principais agressores de
mulheres” nos registros do Sinan. “No ano de 2022, em 77,2% dos casos
registrados, os agressores eram do sexo masculino”, revela o documento.
MULHER
NEGRA
O Censo Populacional de 2022 verificou que o maior grupo do Brasil, cruzando cor e gênero, é composto por mulheres negras (pardas e pretas), 54,5%. Elas também formam o grupo mais exposto à violência sexual, doméstica e outras formas de violência. Dados da Saúde mostram que, naquele ano, 47,9% das vítimas eram negras e 11,9% eram pretas – um total de 59,8%. Mais de 38% das mulheres agredidas eram brancas e quase 1% delas eram indígenas. A taxa de mortalidade por assassinato de mulheres em 2022 foi de 3,2 casos por cem mil habitantes. O grupo etário mais exposto a homicídio são mulheres jovens, de 20 a 24 anos – 6,4 mortes por cem mil habitantes. De acordo com o Sistema de Informações sobre Mortalidade (Ministério da Saúde), 66,7% das vítimas eram negras 60,3%, pardas; e 6,4% pretas. O total registrado das mulheres negras foi mais que o dobro das brancas: 32%.
O
Relatório Anual Socioeconômico da Mulher traz 270 indicadores em sete eixos
temáticos. Além dos dados relativos ao eixo temático “enfrentamento de todas as
formas de violência contra as mulheres”, o estudo mostra que as mulheres negras
enfrentam condições mais adversas que as mulheres brancas e os homens de todas
as cores em outras situações, como por exemplo no mercado de trabalho.
FORÇA
DE TRABALHO FEMININA
Quase
54% das mulheres e meninas brancas (14 anos ou mais) participavam do mercado de
trabalho em 2022, e entre as mulheres pretas ou pardas a taxa era de 51,3%
(dados da Pnad Contínua). A taxa de participação da força de trabalho feminina
foi de 52,5%, enquanto a dos homens foi de 71,9%. A taxa de informalidade foi
maior entre mulheres e meninas pretas ou pardas: 42,8% contra 32,6% das
mulheres e meninas brancas. Como consequência, o rendimento do trabalho também
revela discrepâncias, conforme o relatório do Ministério das Mulheres. “Mesmo
quando as mulheres estão ocupadas no mercado de trabalho, as desigualdades
aparecem em sua menor remuneração. O rendimento-hora médio das mulheres era de
R$ 16 no segundo trimestre de 2022, abaixo do estimado para os homens, de R$
18. Homens brancos ganhavam em média R$ 23 por hora, e as mulheres brancas, R$
19. Na comparação entre homens e mulheres de cor preta ou parda, a diferença
era um pouco menor, R$ 2 por hora em média.”
A
Lei 14.611/2023, estabelece que “a igualdade salarial e de critérios
remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual
valor ou no exercício da mesma função é obrigatória.” A norma prevê que na
hipótese de discriminação por motivo de sexo e raça - assim como etnia, origem
ou idade caberá o pagamento das
diferenças salariais devidas à pessoa discriminada, além de indenização por
danos morais. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação
Nacional do Comércio, Bens, Serviços e Turismo (CNC) ingressaram com uma Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a Lei 14.611/2023. Para a ministra
das Mulheres, Cida Gonçalves, presente ao lançamento do relatório, buscar a
igualdade entre homens e mulheres faz parte do “processo civilizatório. ”Se
queremos democracia em um país civilizado, nós precisamos ter democracia, nós
precisamos ter igualdade e nós precisamos ter justiça social”, disse a
ministra. Fonte: Agência Brasil