segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

REFORMA DO CÓDIGO CIVIL PROPÕE DIVÓRCIO UNILATERAL EM CARTÓRIO E PODE BENEFICIAR VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Por Voz da Bahia

Foto: Pexels

O Projeto de Lei 4/2025, que tramita no Senado como parte da proposta de reforma do Código Civil, prevê mudanças significativas na legislação brasileira, entre elas a criação do divórcio unilateral em cartório quando apenas um dos cônjuges pode solicitar a dissolução do casamento, sem necessidade de consenso. A medida ainda passará pela Câmara dos Deputados e pela sanção presidencial, mas já movimenta debates no meio jurídico ao representar avanços na autonomia individual e na desburocratização dos processos de separação. Para especialistas, a mudança também fortalece garantias de dignidade humana, sobretudo para vítimas de violência doméstica que enfrentam barreiras para se desvincular legalmente de seus agressores.

Dados do IBGE mostram que, em 2023, o Brasil registrou 440.827 divórcios, sendo 27.361 na Bahia e 6.420 em Salvador. Atualmente, a legislação permite dois tipos de divórcio: o consensual, realizado em cartório quando não há litígios, e o litigioso, que ocorre na Justiça quando há discordâncias entre as partes. Com o novo Código, bastará que um dos cônjuges compareça ao cartório onde o casamento foi registrado para solicitar o divórcio. O outro será notificado posteriormente. O advogado e professor de direito civil Roberto Figueiredo explica que a proposta reafirma o caráter incondicionado do divórcio. “O projeto confirma a possibilidade de obtenção liminar do divórcio, ainda que pendentes questões sobre partilha, guarda ou alimentos. O pedido unilateral em cartório torna o procedimento mais rápido e barato”, aponta.

Entre os principais desafios do modelo atual está o alto custo financeiro e emocional dos processos litigiosos, especialmente quando envolve disputa pela guarda dos filhos ou divisão de bens. Para o advogado Marcelo Gimba, mestre e doutor em Direito de Família, o país passou por mudanças profundas desde 2002, quando o Código Civil vigente entrou em vigor. Ele destaca que a reforma busca alinhar a legislação à realidade contemporânea. “Quando o Código envelhece, toda a estrutura da vida civil fica comprometida”, afirma. A proposta também incorpora entendimentos consolidados do STF e do STJ para reduzir contradições e fortalecer a segurança jurídica. Um dos pontos elogiados por especialistas é impedir que o divórcio unilateral seja condicionado a debates sobre partilha ou guarda. “O divórcio não pode servir de moeda de troca emocional ou patrimonial”, ressalta Gimba.

O impacto da mudança é ainda mais evidente no contexto da violência doméstica. Para Roberto Figueiredo, o divórcio unilateral garante celeridade e evita o contato direto com o agressor. Já a enfermeira Quele Ribeiro, presidente da ONG Direito de Viver, lembra que muitas mulheres permanecem em relacionamentos abusivos por medo, dependência econômica ou ameaças relacionadas à guarda dos filhos. Ela relata a história da própria mãe, vítima de agressões e ameaças durante anos. “Quando falava em divórcio, ele a ameaçava de morte. Ela tinha muito medo porque ele era agressivo e dominador”, diz. Quele afirma que, se a possibilidade de divórcio unilateral existisse na época, poderia ter oferecido uma saída mais segura.

Para Marcelo Gimba, a mudança representa não apenas uma questão jurídica, mas de cidadania. “Muitos agressores se recusam a assinar o divórcio para manter controle. Exigir consenso revitimiza a mulher. Exigir demora a expõe. O divórcio unilateral devolve autonomia”. Quele reforça que a proposta pode ser determinante para quem vive sob ameaça. “O Projeto de Lei 4/2025 vem para fazer diferença na vida das mulheres que sofrem violência doméstica. É uma questão de liberdade”, afirma. Fonte: Voz da Bahia