Por Voz da Bahia
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O
Projeto de Lei 4/2025, que tramita no Senado como parte da proposta de reforma
do Código Civil, prevê mudanças significativas na legislação brasileira, entre
elas a criação do divórcio unilateral em cartório quando apenas um dos cônjuges
pode solicitar a dissolução do casamento, sem necessidade de consenso. A medida
ainda passará pela Câmara dos Deputados e pela sanção presidencial, mas já
movimenta debates no meio jurídico ao representar avanços na autonomia
individual e na desburocratização dos processos de separação. Para
especialistas, a mudança também fortalece garantias de dignidade humana,
sobretudo para vítimas de violência doméstica que enfrentam barreiras para se
desvincular legalmente de seus agressores.
Dados
do IBGE mostram que, em 2023, o Brasil registrou 440.827 divórcios, sendo
27.361 na Bahia e 6.420 em Salvador. Atualmente, a legislação permite dois
tipos de divórcio: o consensual, realizado em cartório quando não há litígios,
e o litigioso, que ocorre na Justiça quando há discordâncias entre as partes. Com
o novo Código, bastará que um dos cônjuges compareça ao cartório onde o
casamento foi registrado para solicitar o divórcio. O outro será notificado
posteriormente. O advogado e professor de direito civil Roberto Figueiredo
explica que a proposta reafirma o caráter incondicionado do divórcio. “O
projeto confirma a possibilidade de obtenção liminar do divórcio, ainda que
pendentes questões sobre partilha, guarda ou alimentos. O pedido unilateral em
cartório torna o procedimento mais rápido e barato”, aponta.
Entre
os principais desafios do modelo atual está o alto custo financeiro e emocional
dos processos litigiosos, especialmente quando envolve disputa pela guarda dos
filhos ou divisão de bens. Para o advogado Marcelo Gimba, mestre e doutor em
Direito de Família, o país passou por mudanças profundas desde 2002, quando o
Código Civil vigente entrou em vigor. Ele destaca que a reforma busca alinhar a
legislação à realidade contemporânea. “Quando o Código envelhece, toda a
estrutura da vida civil fica comprometida”, afirma. A proposta também incorpora
entendimentos consolidados do STF e do STJ para reduzir contradições e
fortalecer a segurança jurídica. Um dos pontos elogiados por especialistas é
impedir que o divórcio unilateral seja condicionado a debates sobre partilha ou
guarda. “O divórcio não pode servir de moeda de troca emocional ou
patrimonial”, ressalta Gimba.
O
impacto da mudança é ainda mais evidente no contexto da violência doméstica.
Para Roberto Figueiredo, o divórcio unilateral garante celeridade e evita o
contato direto com o agressor. Já a enfermeira Quele Ribeiro, presidente da ONG
Direito de Viver, lembra que muitas mulheres permanecem em relacionamentos
abusivos por medo, dependência econômica ou ameaças relacionadas à guarda dos
filhos. Ela relata a história da própria mãe, vítima de agressões e ameaças
durante anos. “Quando falava em divórcio, ele a ameaçava de morte. Ela tinha
muito medo porque ele era agressivo e dominador”, diz. Quele afirma que, se a
possibilidade de divórcio unilateral existisse na época, poderia ter oferecido
uma saída mais segura.
Para Marcelo Gimba, a mudança representa não apenas uma questão jurídica, mas de cidadania. “Muitos agressores se recusam a assinar o divórcio para manter controle. Exigir consenso revitimiza a mulher. Exigir demora a expõe. O divórcio unilateral devolve autonomia”. Quele reforça que a proposta pode ser determinante para quem vive sob ameaça. “O Projeto de Lei 4/2025 vem para fazer diferença na vida das mulheres que sofrem violência doméstica. É uma questão de liberdade”, afirma. Fonte: Voz da Bahia