sábado, 13 de fevereiro de 2016

POR QUEM AS CORDAS DOBRAM? O MEDO QUE KANNÁRIO DESPERTA E A TENTATIVA DE CRIMINALIZÁ-LO

Por Clóvis Gonçalves


kannarioZIgor Kannario colocou o pé na porta e tomou o Carnaval para si. Isso já havia acontecido em 2015  quando comandou pela primeira vez a pipoca na segunda-feira de carnaval se repetiu  neste ano de 2016. Curiosamente, ele anteviu o movimento e o anunciou em formato de verso, cunhado pelo próprio: “Depois de nós, é nós de novo”.
Kannario ainda é a melhor novidade do Carnaval da Bahia. Enquanto se discute privatização do espaço público, em engenharia contratual envolvendo Prefeitura e cervejarias interessadas na exclusividade do negócio, o cantor comanda um contrafluxo que destoa desta lógica de mercado.
São milhares de pessoas em ondas gravitacionais – destas recém descobertas pela ciência – que orbitam um astro único. Lá, impassível, em cima do trio, Kannario xinga, grita, mostra os dentes e prega um discurso ainda despolitizado.
Se diz prejudicado pela indústria fonográfica, mas de bate-pronto afirma que: “se tivesse dinheiro colocava minha música para tocar nas grandes televisões”.  É o argumento dos apocalípticos que tentam se integrar a um modelo que obrigatoriamente ainda não fazem parte.
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Ele é um manifesto em si. Uma força bruta que atrai milhares para o Campo Grande numa marcha de descamisados – importante lembrar: a camisa vai na mão, colorida, e é girada ao primeiro pedido do cantor.
A classe média ainda não entendeu o que é Kannario. Mas sente a perda do espaço, do protagonismo e a invasão de uma massa que não costuma ver diariamente em seus espaços de convívio.
O argumento usado na tentativa de deslegitimar o cantor – que não é novidade, registre-se é a criminalização do mesmo. “Bandido”, “ladrão”, “usuário de drogas” – Kannario tem uma folha da cannabis sativa (a planta da maconha) tatuada no pescoço e foi preso, pelo menos duas vezes, com uma quantidade da droga em mãos.
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O cantor foi vaiado pelo bloco Largadinho, durante apresentação com a cantora Claudia Leitte. A camisa do bloco bloco custa entre R$ 500 e R$ 630
A droga, não pode-se perder de vista, tem sua interpretação associada à dimensão social do indivíduo. Em quantos camarotes, blocos e lanchas no circuito da festa foliões não se entregaram aos prazeres sensoriais dos lança-perfumes, doces e cocaínas? A marcha dos descamisados avança, assusta e tentam contê-la. Em nome da  ordem social.Kannario é a desordem. O que bagunça, desfaz.
Mas ele, a exemplo do mundaréu que arrasta, só quer o básico: fazer parte, ser incluído. É uma briga por espaço. “Este ano foi o Carnaval começou a baixar as cordas”, me diz a menina bonita da televisão. Não! As cordas continuam lá. Intocáveis. (Aratuoline)